O assunto hoje era outro, mas ver um dos símbolos concretos
de Bauru despedaçado e não dizer nada é omissão. Trata-se do sofrido, mal-amado
e abandonado Noroeste. E não pelo rebaixamento de ontem à Série A-3 do
Campeonato Paulista, porque futebol é um jogo, de perdas e ganhos, como os
demais,mas pela terra arrasada em que se transformou aquele imenso espaço
situado na região da Vila Falcão, onde já tem até gente imaginando um grande
shopping center no lugar do velho e teimoso estádio de futebol.O que
aconteceria com o Noroeste já estava mais do que desenhado nas pranchetas dos
entendidos, ou não, de futebol. Nos últimos 10 anos, o clube viveu uma
irrealidade, após ter sobrevivido aos 90 anteriores aos trancos e barrancos, mas
com os pés no chão, ainda que pés descalços, quase sem chuteiras e meias. De
repente, um mecenas da bola que encanta os brasileiros e mais dois terços do
planeta assumiu o clube de seu coração. Uma paixão resgatada lá dos tempos em
que era um desconhecido funcionário da Tilibra, que nem indústria era ainda. E
então vivemos uma década de sonho. Até que no final de setembro do ano passado
acordamos dele. Ou, na verdade, nem acordamos, pois o sonho virou pesadelo na
mesma noite, sem tempo para que o clube se recompusesse após um longo devaneio.
O que era doce acabou-se. Um dia, Damião voou para São Paulo. Nunca mais
voltou. Nem se despediu direito. Nem por isso devemos deixar de agradecê-lo.
Mas levou com ele a única coisa que mantinha o Noroeste vivo: o dinheiro dele
próprio, que muitos usaram e abusaram de forma desmesurada e desleal. Era mais
do que previsível que o clube desabaria logo a seguir, em que pesem as boas
intenções e o heroico esforço de Toninho Gimenez, Abel Abreu e, mais
recentemente, de Anis Buzalaf. Agora é hora de recomeçar do zero. Em bases reais.
Do pouco ou quase nada que restou. Ou do muito que significa a história desse
clube conhecido em todo o Brasil e que representa uma progressista e orgulhosa
cidade no País do futebol. Um povo também deve se agrupar em torno de seus
símbolos e o Noroeste é um deles. Portanto, cada um de nós deveria sentir-se um
pouco responsável por seu destino. Não quero fazer discurso de futebolista
apaixonado, embora o seja. Mas quando se trata de algo que nos pertence
enquanto uma cidade e suas manifestações coletivas, é preciso um pouco mais de
zelo de nossa parte. A maioria dos bauruenses mal sabe onde fica o estádio
Alfredo de Castilho.Todos, sem exceções, têm coisas mais importantes com que se
preocupar. Mas a cidade busca hoje, com grande efervescência, seus melhores
rumos e não custa lembrar que lá num antigo bairro de ferroviários há um clube
que poderia ser bem diferente do que é hoje se fosse abraçado pela cidade. É o
convite deste texto, que termina com parte de uma música de Ivan Lins: “Começar
de novo / E contar comigo / Vai valer a pena / Ter amanhecido / Sem as tuas
garras / Sempre tão seguras / Sem o teu fantasma / Sem tua moldura / Sem tuas
escoras / Sem o teu domínio / Sem tuas esporas / Sem o teu fascínio / Começar
de novo...”
João Jabbour/ Jornal da Cidade